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ESTUDO PARA UM ROMANCE OU NOVELA
início de 2011, revisão em meados de 2014                                                                                          


           Ubiracy acabara de ler que os jesuítas, no século XVIII, tinham vendido sua biblioteca na Bahia para os comerciantes usarem as folhas dos livros como embrulho. Ele fez alguns cálculos e lembrou de seu tataravô que trabalhava recém-livre em uma quitanda na ladeira da Barra. Bem possível alguns dos cajus que seu Antônio vendia terem sido envelopados com a mais fina literatura de então. Ubiracy gostou de ponderar sobre o que se fazia, depois das compras desembaladas, com esses fiapos de conhecimento. Certamente eram jogados no lixo, assim como tudo o que há no mundo, é senso comum, um dia deixar-se de valer e tornar-se entulho. Mas quem poderia sugerir melhor destino a um livro, não sendo este mais lido, que o de abraçar frutas e deste modo transfigurar-se em substrato, adubo composto de palavras e açucar? Afinal, algumas frases quedam-se melhor adocicadas. Tornar-se invólucro é mais digno que permanecer em uma prateleira e servir de decoração, de objeto da vaidade de algum ser ardiloso que se prenda ao que o livro tem de físico. Livros descomunicados, esquecidos - assim como pessoas largadas ao ornamento, enumeradas e sortidas por tópico, descansadas em estantes mentais. Somos todos um pouco bibliotecários. Viva os jesuítas.



Rever: história de Salvador, história da Ladeira da Barra, jesuítas no recôncavo baiano, escravidão, carta de alforria, frutas deste século e desta região, tipos de papel dos livros jesuítas, solo, estrutura familiar e seus valores da época, datas, nomes santos para escravos, escravos alfabetizados, bibliotecarismo.


- André Rebelo